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Quinta-Feira, 19 de Setembro de 2024 12:55

História do Brasil no Correio do Agreste – A Confederação do Equador

18/09/2024

Certamente o único episódio que insere o município de Surubim na História do Brasil é a passagem de Frei Caneca e das tropas da Confederação do Equador pelas margens do Capibaribe há 200 anos.

O historiador Fernando Guerra publicará neste Correio do Agreste seu trabalho sob o título “O Agreste Setentrional e a Confederação do Equador”.

A relevância desse momento não foi devidamente entendida pelo setor educacional do município quando o autor sugeriu uma ampla divulgação nas escolas locais. Diante disso e acreditando que o assunto é do interesse de todos, este jornal decidiu desempenhar o papel que caberia ao poder público. Levará aos seus leitores, em forma de diário, a dramática passagem por Surubim e por outros municípios do Agreste das tropas confederadas quando seguiram para o Ceará de onde Frei Caneca voltou preso para ser arcabuzado em Recife. Começamos hoje nossa série. Acompanhe!

A Confederação do Equador -2

Fernando F. Guerra

Bandeira da Confederação do Equador com as predominâncias das cores azul e amarelo, de autoria desconhecida, onde ressaltam as representações da cana de açúcar e do algodão principais produtos econômicos de Pernambuco na época. Ao centro, a cruz remete ao forte sentido cristão do movimento. Os dizeres Religião, Independência, União, Liberdade, traduzem a essência do pensamento norteador confederado. Encimado no quadrilátero amarelo, em destaque, a mão com o “olho que tudo vê” sinaliza para a presença maçônica numa das mais emblemáticas revoluções pernambucanas. Em 2006 a bandeira da Confederação do Equador foi adotada como insígnia oficial do Governador do Ceará. (Foto: Reprodução/ Felipe Fidelis Tobias)

Introdução

Parte deste trabalho, são transcrições do ITINERÁRIO QUE FEZ O FREI DO AMOR DIVINO CANECA, SAINDO DE PERNAMBUCO A 10 DE SETEMBRO DE 1824 PARA A PROVÍNCIA DO CEARÁ GRANDE. Trata-se de um diário de campanha escrito pelo Mártir pernambucano com relatos minuciosos da fuga empreendida pelas tropas republicanas. Nossa abordagem principal diz respeito ao momento em que os confederados transformaram o Agreste Setentrional de Pernambuco no cenário de um dos mais dramáticos episódios da História do Brasil.

 Resumo

No ano de 1824 reacendeu o espírito libertário de Pernambuco e na província teve início um confronto com o poder imperial que resultou na CONFEDERAÇÃO DO EQUADOR, movimento constitucionalista e republicano.

Como antecedentes, registra-se que no dia 12 de novembro de 1823, a Assembleia Constituinte que se reunia no Rio de Janeiro para dotar o país de uma Constituição fora destituída por decreto imperial, sob ameaça de tropas militares e dissolvida, tendo os deputados pernambucanos, ao retornarem à província, feito um Manifesto denunciando o golpe de estado.

Abalada pela drástica medida a junta que governava Pernambuco, no dia 13 de dezembro num Conselho que convocara, pediu que aceitassem sua demissão, tendo sido eleito naquele momento, como seu presidente, Manoel de Carvalho Paes de Andrade que servia de intendente da Marinha.

Em seguida, chegaram notícias da capital do Império dando conta que o imperador que passara a comandar o Brasil de forma absolutista, afastava o governador Manoel de Carvalho Paes de Andrade do governo provincial nomeando em seu lugar Francisco Paes Barreto. Este, considerado como inapto para governar e repudiado pelos pernambucanos.

Contrapondo-se à decisão imperial, no dia 8 de janeiro de 1824 a Câmara de Olinda, ainda capital da província, em Assembleia Geral Constituinte ratificava a decisão anterior de manter Manoel de Carvalho à frente do governo pernambucano, ignorando a nomeação imperial do morgado do Cabo Francisco Paes Barreto. Em sua Cronologia Pernambucana, Nelson Barbalho afirma ser essa medida um “insulto ao imperador e a confissão indisfarçada de insubmissão às ordens emanadas da corte”.

Naquele momento, em Olinda, quando se efetivou o governo de Carvalho, em seu discurso, o grande pensador Frei Caneca concluindo-o reafirmou ser “uma imprudente e arriscada medida do Ministério de Sua Majestade querer teimosa e caprichosamente ir de encontro à nossa felicidade, paz e sossego, em uma ocasião em que todas as luzes os seus despachos nos procuram males e calamidades (sic). Por isso fundado nestas razões, repito, que não se deve admitir Francisco Paes Barreto à presidência da província”.

Estava assim selado, em rápidas considerações, o rompimento entre a província de Pernambuco e a corte imperial do Brasil.

Essa mobilização revolucionária, emancipacionista e republicana, que eclodira no dia 2 de julho de 1824 se opunha ao absolutismo de D. Pedro I deflagrando-se de Pernambuco para as províncias da Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará. A bandeira da independência e da república tremulou nos céus pernambucanos durante os meses de julho, agosto e primeira quinzena de setembro de 1824.

 Confederação do Equador -3

A Represália

Batalha de Afogados – Forças imperiais invadem o Recife – Pintura de Leandro Martins

O imperador D. Pedro I mobilizou forças de terra e mar para sufocar o movimento republicano que eclodira em Pernambuco.

 No dia 18 de agosto de 1824 uma expedição militar imperial chegou a Maceió tendo à frente o brigadeiro Francisco de Lima e Silva de onde após uma semana para se reabastecer, seguiu para Recife. Em 19 o mercenário inglês Lord Cochrane, com a nau Pedro I ocupou o porto do Recife.

As forças pernambucanas não resistiram à invasão do Recife e já no dia 12 de setembro o brigadeiro Lima ocupou os bairros de Santo Antônio e Boa Vista tendo a seguir as tropas pernambucanas batido em retirada.

A trajetória da fuga de Frei Caneca

Frei Joaquim do Amor Divino Caneca, um dos mais emblemáticos heróis e mártires nacionais, nasceu em Recife no bairro de Fora-de-Portas, Freguesia de S. Frei Pedro Gonçalves no ano de 1779, que hoje, sob a denominação de Pilar, situa-se nas proximidades da zona portuária da cidade do Recife.

Ele, que anteriormente esteve entre os heróis pernambucanos envolvidos na Revolução de 1817 e que fora preso e recolhido às masmorras da Bahia, foi o principal mentor intelectual da Confederação do Equador. Difundiu seu ideário de libertação em diversos escritos tais como “Dissertação sobre o que se deve entender por Pátria do Cidadão”, “Cartas de Pítia a seu amigo Damão”, “O caçador atirando à Arara  Pernambucana” entre tantos outros, publicados em periódicos da época dentre eles o Typhis Pernambucano do qual era o editor. O mesmo Frei Caneca dizia “que à proporção que nossos trabalhos se estendiam a beneficiar nossos compatriotas, nós caminhávamos ao perigo e à ruína, pois que nossas verdades chocavam os interesses de D. Pedro de Alcântara, príncipe português que o Brasil imprudente e loucamente havia aclamado seu imperador”.

Quando se viu traído, após as tropas que deveriam defender o Recife abrirem as portas da cidade sem oferecer a menor resistência às forças imperiais; quando sentiu que toda a oficialidade se encontrava dividida em grupos e tendo sido alertado para se ocultar, pois era alvo de intensa procura, juntamente com outros partícipes da conjuração, Frei Caneca tratou de se pôr a salvo, fugindo “das garras da perfídia”.

Ele, João Soares Lisboa, Francisco de Souza, o coronel José Antônio Ferreira, o major José Gomes do Rego, o capitão Braga, José Matias, o irmão deste e um soldado mouco camarada do Braga, desde o dia 10 de setembro articularam-se para a fuga. Mas, somente saíram de Olinda às dez horas da noite do dia 16 tendo atravessado Olinda passando por todos os piquetes procurando a Vila de Igarassu.

Viajaram por toda a noite e amanheceram o dia 17 no engenho Utinga onde o grupo dividiu-se. Cazumbá unido a José Matias “trouxeram ao seu partido o coronel Ferreira”. Caneca afirma que eles “passaram a olhar para nós como pessoas do maior perigo, obstáculos para a salvação dos mesmos, não mais querendo ver um só soldado da divisão pernambucana e nem serem vistos deles”.

Dentro desse clima, na manhã seguinte do dia 18, Rangel, Lisboa e Caneca tomaram o rumo em direção ao engenho Papicú onde jantaram e seguiram para o engenho Caraú pertencente a João Nepomuceno Carneiro da Cunha “afim de que aí conforme as informações que tivessem dos negócios de Goiana tomássemos a deliberação que fosse mais prudente e segura”.

GOIANA

Dia 19 de setembro

Segundo informações colhidas, “em Goiana havia uma reunião de forças do Recife, as quais unidas às de Goiana e Paraíba haviam nomeado um Comandante em Chefe e marchavam para o Ceará”. Acreditaram que esse era o meio que restava para a sustentação da causa da pátria e a salvação das garras do tirano. Acompanhados de um guia que lhes foi dado por Carneiro da Cunha pela meia noite adentraram nas ruas de Goiana que estavam inteiramente desertas. “O escuro da noite e o medonho silêncio em que estava sepultada a vila, os uivos dos cães, tudo cooperou para nos encher de terror”, confessou Frei Caneca em seus relatos. Ali esperavam encontrar as tropas referidas. Após avaliações diversas tomaram a estrada da Soledade e depois de andarem o restante da noite, deram-se com a retaguarda da força, duas léguas acima da vila.

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